Em época da Guerra do Contestado, em 07 de maio de 1913, nascia Sezinando Melo na localidade de Estação Canivete – então ainda pertencente ao município de Rio Negro e só vindo a tornar-se Mafra, Santa Catarina, quatro anos depois.

Com dois anos de vida Sezinando se mudou, com os pais, para a localidade depois denominada “Avencal dos Melo”, onde como bom filho de agricultor desde cedo iniciou os trabalhos na roça, em época que o transporte da produção ainda era feito com mulas, até um armazém da localidade de Saltinho do Canivete, onde vive atualmente.

Com uma lucidez e uma saúde surpreendente, “vô Sizo” se lembra da vida desde a infância e destaca que à época havia mais moradores em Saltinho do Canivete e arredores, do que hoje.

Sempre atuando na agricultura e na extração de pinheiros Sezinando conta que quando deixou a localidade de Estação Canivete foi por ‘desgosto’ de seu pai e de seu avô, que perderam parte das terras com a chegada da ferrovia, ocasião em que trocaram suas terras com a empresa Lumbre que tinha interesse em ficar mais próxima da estrada de ferro.

Recorda que o perímetro urbano de Mafra era pequeno quando da criação do município e que conheceu outros grandes nomes que marcaram a história da cidade, sem nunca haver se afastado da vida no campo, onde vendeu também muita lenha para uso da própria ferrovia que aos poucos vinha se expandindo.

Com dificuldades de transporte e estradas, ainda adolescente atuava como “linheiro” dos ‘cargueiros de mulas’ para levar a produção do pai até um forte comerciante da região. “No começo se plantava muito milho e feijão, depois a produção na região foi se diversificando com a erva-mate e fumo”, aponta.

Em 1935 Sezinando se casou, mas o destino quis que cerca de um ano e meio depois ficasse viúvo, tendo sua mulher e filho falecido durante o parto. “Naquele tempo não existiam recursos, as pessoas morriam com muita facilidade por falta de atendimento médico”, diz.

Voltou a se casar em 1941 (23/08) com Maria Pimentel de Melo, com quem tem sete filhos que já lhe renderam 27 netos e 15 bisnetos. Com setenta e um anos de casamento hoje vive longe da mulher que está sob cuidados de um filho em São Bento do Sul e ele com a filha e genro Marli e Luis Carlos Fonseca, em Saltinho do Canivete. De acordo com Marli, até um ano atrás o casal vivia junto em Saltinho do Canivete, mas com problemas de morarem sozinhos e da educação antiga cada um cuidar de suas coisas, optou-se por levá-los a morar com algum filho.

O “vô Sizo” criou os sete filhos somente com o trabalho da lavoura e desde quando crianças já investia no futuro dos mesmos, colocando inclusive as terras que adquiriu em nome dos mesmos.

Saúde em ordem

Sezinando Melo fumou por cerca de trinta anos e parou espontaneamente. Também ingeria bebida alcoólica socialmente e comia bem e bastante, contou à nossa reportagem.

Ele lembra, por exemplo, que quando ficavam ‘acampados’ na roça, como só havia uma panela fervia o toucinho nela e depois na própria gordura cozinhava o feijão. “Quem disse que isso me faria mal para a saúde? Estou aqui até hoje”, declara.

Na vida só teve três problemas mais sérios de saúde, sendo um caso de sinusite que virou meningite e outro de muito vômito e diarreia (‘por uma mistura de leite com caqui’) que quase lhe custou a vida, porque indo ao médico este o internou e começou um tratamento errado. “Dez dias depois recebi alta e continuava com o mesmo problema, foi quando estive em uma farmácia em Rio Negro e um rapaz ainda novo, hoje já falecido, me forneceu um remédio que me curou”.

Outro caso de Sezinando foi de ‘cataratas’, tendo inclusive, como ele diz, ‘uma das vistas raspadas há cerca de 30 anos’.

De acordo com a filha Marli cuidar do “vô Sizo” é fácil. “Apesar de ele reclamar muito e afirmar que só está nos incomodando o único medicamento que faz uso é um diurético e vez em quando antigripais, não apresenta nem mesmo problemas de diabetes ou de pressão arterial”, ressalta.

Um ‘inspetor de quarteirão’

Dentre tantas histórias que nos contou em cerca de uma hora que passamos com o mesmo, Sezinando falou da época em que foi nomeado ‘inspetor de quarteirão’, uma espécie de autoridade local que inclusive era incumbida de resolver desavenças entre os moradores. Ele ainda sorri ao contar que certa vez um rapaz amigo seu foi até ‘a bodega’ de Frederico Steidel e beberam bastante. Após deixarem o local, já na rua e alcoolizados os dois rapazes acabaram por brigar e o dono do bar registrou queixa na Delegacia.

Dias depois o ‘vô Sizo’ recebeu ofício do delegado determinando que ‘amarrasse’ os dois e os levasse até a Delegacia. Achando errado o ato e até mesmo com receio de tentar amarrar um deles ‘que era bem mais forte e grande que ele’, foi falar então com o irmão do rapaz e mostrou o ofício, pedindo para que ele mesmo levasse ambos e apresentasse ao delegado – conta sorrindo, oportunidade em que o caso foi arquivado porque ambos haviam apenas discutido e em via pública, não na ‘bodega’.

Há muito mais casos de vida que Sezinando conta, mas pouco espaço para publicarmos.

Segredo para viver 100 anos e muito mais, se Deus permitir? “Não, basta saber viver e esse é meu recado para a juventude de hoje”, afirma o vô Sizo.

Política? “Não, sempre preferi ficar meio de longe e nunca incentivei meus filhos e filhas a entrarem nesse meio. Sem trabalho não se vence na vida e isso eu ensinei a eles”, afirma.

Um pai dedicado

“Ele não teve como nos dar um estudo melhor, mas nos deu uma educação exemplar e demonstrou se preocupar com nosso futuro desde que nascemos”, enfatiza a filha Marli, com quem Sezinando Melo reside há um ano.

Indagada sobre eventuais problemas em cuidar de uma pessoa com a idade do seu pai ela nos diz que é fácil lidar com o mesmo, que ‘tem um único problema que é reclamar demais, mas isso é coisa da idade e nós entendemos’.

Marli Fonseca conta que irmãos ajudam financeiramente aquele que vem cuidando de sua mãe em São Bento do Sul, mas afirma que não pede nada de dinheiro para os mesmos. “Não faço mais que minha obrigação de filha, ele cuidou da gente, nos deu um futuro já quando pequenos que colocava terras em nosso nome, sempre pensou em nós e agora o mínimo que posso fazer é ficar ao lado dele”, garante.

Ela destaca que pela idade seus pais além de estarem morando sozinhos também vinham discutindo muito, motivo da decisão de cuidar dos mesmos em casas separadas. Ela reclama, porém, das poucas visitas dos irmãos ao seu pai, além de poucos telefonemas, mas o “vô Sizo” defende os filhos com “unhas e dentes”, mesmo com lágrima nos olhos quando diz (acreditando) que os filhos o procuram e insistem para que vá passar dias na casa dos mesmos. “Todos têm carro e podiam vir buscá-lo para passear ou mesmo vir visitá-lo, isso diminuiria a depressão que é visível nele principalmente quando meus filhos me telefonam, o que é costumeiro”.

Embora o aniversário seja na terça-feira a data será comemorada no sábado (11), com Missa a ser celebrada possivelmente por um padre sobrinho de Marli, seguido de jantar familiar no salão da Igreja de Saltinho do Canivete.

Com o grande exemplo de vida e dedicação aos filhos, o que desejamos nós da Gazeta de Riomafra, é que o ‘seu’ Sezinando viva ainda muitos e muitos anos e sempre com a mesma lucidez, nos contando histórias de vida que são inclusive a história da nossa cidade. Parabéns!

Casa do 'vô Sizo' em 'Campina dos Melo'

Vô Sizo e vó Maria com cinco dos seis filhos

Vô Sizo e vó Maria

Vô Sizo continua ativo aos cem anos